Aceite! Não somos a Inglaterra. E muito menos a Alemanha
Usar a discussão de retorno na Premier League e a volta do futebol na Bundesliga para sustentar retomada no Brasil é mistura de ignorância, desinformação e falta de senso coletivo
Por Bruno Formiga
Inglaterra e Alemanha estão entre o melhores IDHs (Índice de Desenvolvimento Humano) do mundo. Países com economia e políticas públicas fortes. Sistemas de saúde bem estruturados e senso de coletividade afinado. Por isso, e não por um acaso, um pode marcar data para o retorno do futebol e o outro se dar ao luxo de ser a primeira grande liga da Europa a reabrir os gramados.
A Premier League planeja retomada no dia 1º de junho. A Bundesliga volta agora, dia 16 de maio. As notícias bateram forte por aqui, onde clubes fazem pressão pra retorno mesmo com a sociedade ainda debatendo coisas básicas como a utilidade do isolamento social.
Lembrando que a Inglaterra tratou a pandemia no início assim como o Brasil: com desdém. Depois correu atrás e conseguiu conter a onda de contágio e administrar os estragos. Já na Alemanha o tratamento sempre foi diferente: testagem em massa e comunicação clara, sem rodeios, sobre a gravidade da situação.
No fundo, projetos de país bem distintos do nosso. E resultados obviamente distintos.
Usar a discussão de retorno na Premier League e a volta do futebol na Bundesliga para sustentar retomada no Brasil é mistura de ignorância, desinformação e falta de senso coletivo. É quase uma loucura completa.
Com mais de 11 mil mortos e um horizonte ainda incerto, soa como total desrespeito com vítimas e familiares querer voltar precocemente, seja como for, com uma atividade longe de ser essencial (por mais que o futebol cumpra um papel social gigantesco) e que pode trazer momentos de comemoração.
Não temos testes suficientes nem para os profissionais de saúde. Falta o básico. Para o futebol voltar, jogadores, comissões, dirigentes e muitos outros envolvidos precisariam saber constantemente se têm ou não reagente ao coronavírus. E isso, convenhamos, chega a ser constrangedor enquanto sociedade.
Total inversão de valores. Mas nada disso surpreende mais. Normalizamos o absurdo. Diariamente.